sexta-feira, 8 de abril de 2011

Cinema: Rio

Era preciso um brasileiro para fazer um filme sobre o Rio de Janeiro. Esqueça os olhares estrangeiros, a falta de sensibilidade gringa para compreender a cor, o ritmo e o gingado. Na animação Rio, do carioca Carlos Saldanha – mesmo diretor da série A Era do Gelo – a Cidade Maravilhosa está lá, toda captada na tela, em suas qualidades e problemas, embora esses venham um pouco amenizados. Afinal, o esse é um filme que tem primariamente como público as crianças.

Estreando em cerca de mil salas, Rio torna-se o maior lançamento em cinema no Brasil, onde entra em cartaz antes de em qualquer outro país. E, não é para menos, ao retratar o Rio de Janeiro, a animação de Saldanha faz não só uma homenagem à cidade, mas a todo o país. No centro da história, está a ararinha-azul Blu (Jesse Eisenberg, na versão legendada; Gustavo Pereira, na dublada), uma ave que foi capturada e mandada para os Estados Unidos.

Vai parar na fria Minnesota, onde mora com sua dona Linda (Leslei Mann; Sylvia Salustti), proprietária de uma livraria, que tem a ave como única companhia.
Blu, que está totalmente adaptado, tem a chance de reencontrar suas raízes quando ele e sua dona são procurados por Túlio (Rodrigo Santoro, dublando as duas versões), um biólogo brasileiro que pretende levar a ave de volta ao Rio de Janeiro para que ela cruze com Jade (Anne Hathaway; Adriana Torres), a única fêmea viva da espécie em extinção. A chegada de Linda e Blu ao Rio de Janeiro é retratada como um choque cultural. Em pleno Carnaval, encontram ruas fechadas, gente em poucos trajes sambando para todo lado e muita música.

Esse é o Brasil que os estrangeiros querem ver – especialmente no cinema –, mas também é o Brasil verdadeiro, aquele que pára uma semana para o Carnaval.
Esse olhar de dentro para fora é difícil, e muita gente vai reclamar – dizendo que o filme mostra apenas Carnaval, favela e paisagem. Mas será que não é exatamente isso – os contrastes, os paradoxos – que fazem do Brasil um país tão culturalmente rico e atrativo? Os problemas aparecem quase como metáforas.

Pequenos saguis são batedores de carteiras; a favela onde moram alguns personagens do filme é mais pacífica do que uma de verdade, mas, ainda assim, há tráfico – não de drogas, mas de animais silvestres.
Blu e Jade serão capturados por um pequeno órfão (Jake T. Austin; Cadu Paschoal) e entregues para um chefão da venda ilegal de animais, Marcel (Carlos Ponce; Ricardo Schnetzer). Quando a dupla consegue fugir, suas pequenas pernas estão acorrentadas. Como Blu, sempre vivendo em cativeiro, não aprendeu a voar, eles são obrigados a correr, na companhia de outras três aves, o tucano Rafael (George Lopez; Luiz Carlos Persy), Nico (Jamie Foxx; Alexandre Moreno) e Pedro (Will.i.am; Mauro Ramos), enquanto são perseguidos por uma malvada cacatua (Jemaine Clement; Guilherme Briggs).

Há no mínimo meia dúzia de momentos memoráveis em Rio, especialmente pelo colorido e pelo brilho que, aliados ao ritmo, tornam-se irresistíveis, como na cena de abertura em que aves tropicais sambam e cantam; no desfile no sambódromo; ou em um passeio romântico de bondinho em Santa Teresa. Saldanha e sua equipe acertaram em cheio, principalmente porque atentaram para os detalhes – de cores e formas – que trazem veracidade para o filme. Estão na tela as ladeiras estreitas do Rio de Janeiro, as pequenas vielas da favela e também as praias lotadas.


Rio
também é um filme de referências e homenagens. Blu e Jade não se dão bem, mas precisam se suportar, pois estão acorrentados um ao outro – tal qual o casal de Os 39 Degraus, de Alfred Hitchcock. Na cena em que fogem pele favela, há imagens bem parecidas com a galinha em fuga de Cidade de Deus, de Fernando Meirelles. Mas são os antigos musicais – com uma piscadela para Carmem Miranda, lembrada no chapéu de frutas do cachorro Luiz – que se sobressaem no longa de Saldanha. Não que a ação páre para os personagens cantarem. As músicas estão bem inseridas na narrativa, mas esses números são um show à parte.


A animação Rio tem tudo para se tornar um clássico – para agradar a adultos e crianças, com seu roteiro bem sacado e seus personagens naturalmente cativantes. Mas não é só isso que torna o filme memorável. Há um toque mágico, algo inexplicável, porque na tela, os traços pulsam com vida, ritmo e brilho – algo bem parecido com o Carnaval brasileiro.

alysson oliveira*

* texto do amigo alysson oliveira, publicado originalmento no site cineweb, um endereço bem bacana para os amantes da sétima arte

Nenhum comentário: