Será que ele conseguirá? Se eu tivesse de apostar, jogaria minhas fichas no “não”. Em primeiro lugar porque Titanic foi um desses fenômenos que ninguém explica. Mais do que um filme, foi um evento, uma catarse coletiva mundial difícil de ser justificada com argumentos racionais. E, em segundo lugar, porque Avatar não é tão excepcional e/ou catártico como foi Titanic. É, sim, um belo entretenimento, mas sem a carga emocional suficiente para chegar ao tão sonhado patamar de US$ 2 bilhões nas bilheterias do planeta. O melhor a fazer, então, é assisti-lo sem tentar traçar comparações.
A trama é convencional: em algum lugar no futuro, os humanos estão monitorando o planeta Pandora, em cujo subsolo existe uma grande reserva de uma determinada substância muito importante para a nossa Terra. Não fica bem claro o que e por que, mas isso não é importante. Importante mesmo é que em Pandora existe toda uma civilização extremamente desenvolvida mental e energeticamente, ainda que na Idade da Pedra em se tratando de armas de guerra. São seres similares a fadas ou elfos, maiores que os humanos, quase mágicos, e onde todos os homens têm o nariz parecido com o de Woody Harrelson, e todas as mulheres têm o pescoço da Uma Thurman.
Para tentar dominá-los, nós, terráqueos, criamos a tecnologia dos Avatares, ou seja, humanos modificados com DNA do pessoal de Pandora, feitos para desembarcar no planeta deles, e estudá-los mais de perto para possamos subjulgá-los da maneira mais eficiente possível. O Avatar seria, então, uma espécie de espião que se infiltra entre os aliens para conhecer seus segredos. Claro que um Humano (Sam Worthinghton) se revolta contra a situação. Como sempre acontece neste tipo de filme.
Avatar demora a engrenar. Uma quantidade muito grande de informações é arremessada sobre o público logo nos primeiros minutos, ao mesmo tempo em que boa parte da plateia tenta se acostumar aos óculos 3D, tecnologia muito boa, sim senhor, mas que rouba uma quantidade absurda de luminosidade da tela, fazendo parecer que Avatar se passa quase sempre à noite. Fica até a impressão de que as salas brasileiras não estariam utilizando lâmpadas dentro das especificações exigidas pelo sistema, tamanha é a falta de luz e brilho. Pelo menos foi esta a sensação que tive durante a sessão de imprensa realizada no Shopping Bourbon, em São Paulo.
O roteiro - também escrito por James Cameron - se utiliza muitas vezes da desagradável muleta da narração em off, onde o protagonista fica explicando verbalmente o que está acontecendo, ao invés de tentar encontrar soluções mais imagéticas e cinematográficas. Passados os primeiros esforços - para ouvir os offs, absorver as informações e arrumar os óculos - o filme se desenvolve sem muito ritmo, chegando a se tornar cansativo e sinalizando que talvez não fossem necessários todos os seus 160 minutos para contar a história. No terço final, porém, tudo melhora. Os personagens ganham mais vida, mais dimensão, a ação é mais intensa e a briga entre as civilizações e as culturas literalmente pega fogo.
É impossível não traçar um paralelo entre a invasão humana predadora em Pandora e a cultura americana de invadir e destruir toda e qualquer civilização que tenha algo que eles precisem. Nem vale a pena falar da finada política Bush, já que Avatar está na cabeça de James Cameron já há quase 20 anos. Mas sempre foi assim, seja com Coreia, Vietnã, Afeganistão, Iraque ou coisa que o valha. Tanto que uma das naves de guerra dos Humanos contra Pandora se chama Valquíria, provavelmente uma referência à música que o personagem de Robert Duvall escutava enquanto chacinava vietnamitas em Apocalypse Now.
Como também é típico da cultura de entretenimento norte-americana, Avatar prioriza o visual em detrimento da profundidade. Em torno de 40% do que se vê na tela é resultante de ação filmada, e os restantes 60% foram gerados por computador, consumindo um orçamento total estimado em US$ 230 milhões. Como sempre, a trilha sonora é exagerada e incessante, e a mensagem politicamente correta valoriza a natureza, a paz e a tolerância entre os povos culturalmente diferentes. A pergunta que fica é sempre a mesma, em se tratando de blockbusters: por que os filmes que trazem mensagens de Paz são tão violentos?
Exibição: dia 18, sexta, nos cinemas nacionais
Classificação: 12 anos
(celso sabadin*)
* o multimídia e querido amigo celso sabadin é autor do livro autor do livro vocês ainda não ouviram nada – a barulhenta história do cinema mudo e jornalista especializado em crítica cinematográfica desde 1980. Atualmente, dirige o planeta tela (um espaço cultural que promove cursos, palestras e mostras de cinema) e é crítico de cinema da TV gazeta e da rádio bandeirantes.
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